Laboratório de Políticas Culturais

Entrevista na Secretaria de Turismo e Cultura de São Gonçalo

No dia 15 de maio de 2024, foi realizada uma entrevista presencial com a então Secretária Júlia Sobreira e sua assessora Alana Mendonça. A entrevista foi gravada com a permissão de todos os presentes e transcrita para a realização desta análise de conteúdo.

A secretária iniciou sua fala apresentando as dificuldades que enfrenta no município: o desconhecimento das pessoas sobre toda a burocracia que envolve a gestão pública; a desmobilização da classe artística; e o baixo orçamento do município e, particularmente, da Secretaria de Turismo e Cultura.

Sobre a burocracia, a entrevistada salientou a dificuldade que é trabalhar com a “máquina pública”, com a necessidade de realização de licitação para a compra de qualquer item para a secretaria, mas destacou que ela é fundamental para garantir a impessoalidade e fazer com que os processos sejam mais democráticos, e que as pessoas têm dificuldade de entender isso e acabam vendo a burocracia sempre pelo viés negativo. Além disso, destacou a importância da reorganização pela qual a Secretaria passou desde o início da sua gestão, há um ano, incluindo a criação de diversas subsecretarias e a própria reorganização do espaço de trabalho. Ela afirma que o objetivo é criar maior institucionalidade para a Secretaria e melhores condições de trabalho para a equipe, atualmente formada por 60 pessoas (lotadas na secretaria e distribuídas entre os equipamentos culturais geridos pela prefeitura).

Com relação ao orçamento, as entrevistadas destacaram que dificilmente a prefeitura terá recursos para investir na cultura dentro do orçamento municipal, que elas avaliam como muito pequeno. E que o cenário é de investimentos por meio recursos indiretos. Elas citaram que o orçamento municipal gira em torno de 2 bilhões, sendo que o orçamento da Secretaria de Turismo e Cultura corresponde a 5 milhões, que são gastos para a implementação de melhorias na infraestrutura da própria Secretaria e manutenção dos equipamentos culturais mantidos pela prefeitura: Centro de Tradições Nordestinas, Casa das Artes, Teatro Municipal, Lona Cultural do Jardim Catarina, Centro Cultural Joaquim Lavoura (Lavourão), sendo que alguns estavam fechados quando do início da atual gestão da secretaria. 

“Eu acho que de uma maneira bem resumida é o que a gente está fazendo aqui, a gente reabriu todos os nossos equipamentos que estavam fechados, a Casa das Artes estava fechada há dois anos; o Centro de Tradições Nordestinas também estava fechado e a gente vai reabrir sexta-feira; a gente reformou a orla do Carequinha que fica na praça Zé Garoto; a gente reformou e abriu o teatro. A Lona do Catarina estava fechada, a gente também reabriu, e agora a nossa meta é entrar dentro da Lona do Catarina, a gente vai colocar atividade cultural lá de segunda a sexta-feira. Acredito que a gente tá conseguindo andar, dentro das nossas limitações e dentro do nosso cenário.”.

(Secretária de Turismo e Cultura de SG, 2024)

Eu acho que neste ano, de forma resumida, é isso que a gente fez. Criou a capacidade operacional institucional da secretaria. A secretaria não tinha carro. São coisas que às vezes as pessoas não veem no dia a dia. A Secretaria de Cultura não tinha um bebedouro, as pessoas não tinham onde beber água. A Secretaria de Cultura não tinha impressora. Então trabalhar dentro de um município traz esse tipo de desafio. E eu acho que a gente está avançando.
(Secretária de Turismo e Cultura de SG, 2024)

Além disso, a secretária citou a utilização dos recursos próprios da Cultura para a manutenção do Programa Cria São Gonçalo, voltado para a formação de moradores do município em diversas áreas artísticas, como coral, dança, audiovisual, teatro, música, artesanato, animação, democratizando o acesso à cultura e fortalecendo a aptidão gonçalense para as artes. O Programa reúne dez cursos diferentes e atinge um público de todas as idades; em seu último ciclo contemplou 345 pessoas em três dos equipamentos de cultura geridos pela prefeitura.

Para além dos programas financiados com os recursos próprios da Secretaria, existem programas que são financiados e desenvolvidos pela Fundação de Artes de São Gonçalo (FASG), instituída em 2001 para incentivar, difundir e promover a prática e o desenvolvimento de atividades culturais e artísticas no município. A FAESG administra e mantém o Patrimônio Cultural da cidade, assim como os seguintes aparelhos culturais, esportivos e de lazer: Casa das Artes Villa Real (Rua Moreira Cesar, S/N, Centro); Escola Municipal de Música Pixinguinha (Bairro do Paiva); Lona Cultural Lídia Maria da Silva (Rua Albino Imparato, S/Nº, Praça Jornalista Valfrido Rocha, Jardim Catarina); Teatro Carequinha (Rua Oliveira Botelho, S/Nº, Anexo ao Colégio Municipal Ernani Faria, Neves); Lona Cultural George Savalla Gomes – Palhaço Carequinha (Rua Moreira Cesar, S/Nº, Praça Estephânia de Carvalho); Espaço de Dança Portal 24 horas Isaac Newton (Estrada da Conceição, Nº 1.111, Porto do Rosa); Praça Vida Ativa (Rua Jaime Figueiredo, N° 2.299, Camarão); Praça do Jardim Catarina (Av. Dr. Albino Imparato, S/N, Jardim Catarina); Praça do Califórnia (Rua Arlindo de Carvalho, S/N, Jardim Califórnia); Praça do Barro Vermelho (Travessa Dona Francisca, N° 2-30, Barro Vermelho); Praça Chico Mendes (Rua Joaquim Laranjeiras, N° 116, Raul Veiga); Praça João do Pulo (Rua Alfredo Bahiense, N° 624, Boassu); Praça do Jardim Alcântara (Rua Francisco Campos, N° 222, Jardim Alcântara).

Há ainda o programa Caravana de Arte e Lazer, criado em 2022, que percorre as principais áreas de vulnerabilidade social do município com a oferta de brincadeiras lúdicas, e atividades esportivas e artísticas.

No entanto, a Secretária de Turismo e Cultura afirmou que não há previsão de lançamento de novos programas voltados para a cultura, e que o foco atual está na operacionalização dos recursos advindos das Leis Aldyr Blanc e Paulo Gustavo. Um ponto importante é que essas transferências de recursos são realizadas fundo a fundo, o que garante a aplicação do recurso para um determinado fim. Além disso, outro ponto de destaque dado pela secretária é o fato do edital da Paulo Gustavo permitir a utilização de parte dos recursos para a operacionalização do próprio edital, e que São Gonçalo inovou ao criar um sistema para a institucionalização dos processos de operação dos editais:

Como a gente vai ter só recursos indiretos, a gente precisa de alguma forma aperfeiçoar a maneira como esses recursos vão chegar pra gente. Então a gente não vai trabalhar mais com o Google Forms, vamos inserir tudo dentro de um sistema. O Google Forms é insano para a gestão de dados. Vocês têm a noção de que a gente teve que trabalhar com 22 planilhas, com todos os documentos de 1.325 pessoas? a gente enlouqueceu. Então a gente institucionalizou, e a partir do dinheiro da operacionalização da Paulo Gustavo, criou um sistema. Então os próximos editais estarão dentro de um sistema. Isso dá mais transparência e dá mais facilidade para que a gente possa manipular esses dados. A gente também desenhou um processo de autorreferenciamento, então todo mundo vai saber onde os projetos vão ser executados. […] São Gonçalo é o único município do Brasil, de verdade, que usou o recurso dessa forma, pra gente dar institucionalização e pra gente fazer uma pesquisa de impacto. Então, no final, a gente tem uma pesquisa de impacto para entender de que maneira a cadeia da cultura movimenta a cidade

(Secretária de Turismo e Cultura de SG, 2024).

As entrevistadas afirmaram que 1.325 projetos concorreram no edital da Lei Paulo Gustavo, em 2023, e que isso só foi possível porque a própria secretaria incentivou as pessoas a se inscrever, fornecendo capacitação e atendimento presencial para a solução de dúvidas. Isso porque o diagnóstico delas é de que a classe artística estava muito desmobilizada, incrédula na Secretaria de Cultura e pouco instrumentalizada, ou seja, não conhecia os recursos de editais e os meios oficinais para obter esses recursos. Para elas, a baixa qualidade dos projetos submetidos mostra a deficiência que o município tem de capacitação dos artistas.

Elas explicaram que os pagamentos referentes à Paulo Gustavo estão sendo realizados, mas que para cada pagamento é necessário abrir um processo administrativo que precisa passar por diversas instâncias da prefeitura, e que isso é demorado. Mas há o compromisso da secretaria em finalizar esses repasses até o final de junho de 2024. A secretária explicou ainda que além dos processos para pagamento, é necessário abrir um processo de prestação de contas para cada projeto, além de processos para arquivamento dos projetos que não foram contemplados, o que gera uma quantidade muito grande de trabalho e responsabilidade para a secretaria.

Com relação à Aldyr Blanc, o segundo edital está previsto para ser lançado em junho de 2024, após a finalização dos pagamentos do edital da Lei Paulo Gustavo. Para este edital, além do financiamento de projetos, estão previstas premiações, e a ideia é que a contrapartida dos premiados seja a realização da sua apresentação cultural nos espaços de cultura geridos pela secretaria e nas escolas da rede pública municipal.

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